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(*) Carlos Alberto Schmitt de Azevedo A história das relações de trabalho ao longo do tempo possui um componente quase que imutável: a cada expressão de progresso tecnológico ou dos meios de produção surge o contraponto daqueles que denunciam a perda e fechamento irreversível de postos de trabalhos, trazendo em sua esteira o fantasma do desemprego e, em muitos casos, a extinção de determinados ofícios e profissões. O auge dessa percepção e desse embate ocorreu com a deflagração, no século IXX, na Inglaterra, do processo conhecido como revolução industrial, com o advento das máquinas a vapor e da mecanização das linhas de produção, quando com o ingresso das máquinas no universo fabril, provocou-se uma onda de demissões sem precedentes, ocasionando reações violentas dos trabalhadores que partiram, literalmente para a guerra, invadindo fábricas e destruindo o maquinário que lhes roubara o emprego, que já era exercido em condições precaríssimas, para não dizer sub-humanas e degradantes. Mas, como hoje o sabemos, esse foi um movimento irreversível em praticamente todos os campos da produção e do trabalho humano. A entrada no século XX, onde o progresso tecnológico avançou a olhos vistos trouxe, também, para o primeiro plano, em vários países e culturas, discussões sobre a necessidade de se garantir trabalho decente e subsistência digna para os trabalhadores, principalmente àqueles mais fragilizados e explorados dentro das cadeias de produção.
Nesse aspecto, no universo do trabalho, o século XX despontou como a era de ouro das entidades representativas dos trabalhadores, como sindicatos, associações de classe, cooperativas ou quaisquer outros mecanismos onde pudessem se reunir e juntos lutarem por seus direitos, fosse através dos instrumentos legais, quando haviam, fosse com o recurso da greve, quando patrões e trabalhadores não conseguiam atingir o consenso. Os exemplos e histórias dessas lutas escreveram páginas heroicas, pungentes, onde em nome do trabalho decente, do respeito aos direitos humanos mais comezinhos, forjaram-se lideranças e instituições que marcaram, ao redor do mundo, de forma indelével a velha máxima de que juntos somos mais fortes. Mas, acho que nenhum de nós, que militamos há tanto tempo na área da representação laboral, estávamos preparados para o salto tecnológico impressionante trazido a reboque com a chegada do século XXI e a verdadeira “revolução” que essas mudanças trouxeram para o mundo das relações de trabalho nos quatro cantos do globo. Costumo dizer, que mantido o andar da carruagem nossos filhos e netos não conhecerão o sistema formal de trabalho, como vínculo empregatício, direitos e garantias trabalhistas como os conhecemos hoje, embora em número e situações cada vez mais esparsas. Esse fenômeno que nos causa tanto temor e perplexidade é reconhecido planetariamente pela alcunha de Uberização, reflexo daquele aplicativo embutido em celulares, originariamente criado para ligar diretamente prestadores de serviços de transportes com seus potenciais clientes, eliminando dessa forma a intermediação de empresas e cooperativas de taxistas, no caso, além de oferecer preços abaixo dos praticamos pela concorrência. As discussões e conflitos daí advindos são sobejamente conhecidas por todos, principalmente o viés mais negativo que gerou ondas de intolerância e violência. Todavia, o conceito da Uberização vem prosperando por outros meios e atividades, atingindo, creiam vocês, até mesmo a oferta de serviços médicos, além de um sem número de outras atividades de prestação de serviços, onde a tônica comum é a oferta de um serviço mais barato, quase sempre com uma remuneração aviltante para o profissional, sem a devida garantia para o cliente, caracterizando de forma inequívoca uma inadmissível precarização das relações de trabalho que colocam em risco conquistas e garantias históricas dos trabalhadores adquiridas ao longo de mais de dois séculos de lutas renhidas e muitas vezes sangrentas. Aqueles que representam os trabalhadores não são contra o progresso, mas a nossa utopia humana, sempre foi calcada que esse progresso reverteria invariavelmente a favor do ser humano, lhe proporcionado uma vida mais digna, com mais tempo para sua família, acesso ao lazer e a cultura e as benesses de uma vida digna, devidamente recompensada por seu trabalho e esforço pessoal. Mas, infelizmente o que vivenciamos hoje é o mundo corporativo e patronal caminhando a passos largos para a extinção completa dos ditames do trabalho decente e da justiça social como vemos acontecer aqui e agora no Brasil, com o governo federal, através de seus diversos tentáculos, envidando esforços para mudar as regras previdenciárias, o desmonte da CLT e das leis trabalhistas, além do congelamento dos orçamentos da educação e saúde por mais de 20 anos. Isso não pode ser considerado como progresso ou modernização das relações de trabalho. Para nós não passa de precarização e desrespeito com os trabalhadores que sempre acabam, pagando a conta pela má gestão da coisa pública. Precisamos, urgentemente, de um aplicativo que favoreça os trabalhadores de todo o mundo! (*) Presidente da Confederação Nacional das Profissões Liberais – CNPL
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