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Não há saída única e isolada para o problema da escassez de operários no setor. Mas também não faltam opções para encarar o problema. Conheça algumas alternativas
O problema da escassez de operários na construção civil tem se agravado nos últimos dois anos. Pesquisa realizada pelo Portal AECweb com 602 respondentes indicou que 96% encontram dificuldade de contratar mão de obra qualificada para os canteiros de obras no Brasil.
A baixa de renovação dos trabalhadores (53,7%), a falta de treinamento e capacitações (49,2%) e o aumento do trabalho informal (47,3%), fora do mercado atendido por construtoras, aparecem como as principais razões para a dificuldade na contratação.
Na sequência, despontam o envelhecimento dos trabalhadores (45,2%) – uma consequência da falta de renovação –, a necessidade de esforço físico (30,7%) e a falta de perspectivas de crescimento (28,1%).
As causas para o problema têm sido muito discutidas pelos empresários e lideranças setoriais.
Mas o que as construtoras e os profissionais do setor podem fazer para minimizar o problema e seguir em frente com as obras?
Vamos apontar e comentar aqui sete alternativas.
São iniciativas que, se tomadas de forma isolada, provavelmente, não darão conta de amenizar a dificuldade.
Se integradas e levadas adiante pelo conjunto das empresas, têm condições de ajudar a virar o jogo.
Há, entretanto, eventuais prós e contras e algumas inadequações por conta do perfil de cada empresa e do tipo de obra a ser executada.
Por isso, cada companhia deve avaliar a melhor solução para seu caso específico.
1) CONTRATAÇÃO DE MÃO DE OBRA PRÓPRIA
Comum em algumas regiões e localidades no Brasil, tem sido adotada por grandes empresas que costumavam optar pela terceirização e contratação de subempreiteiros. É o caso, por exemplo, da Trisul e da Patrimar.
“A contratação de mão de obra própria pode até elevar os custos no curto prazo, mas compensa no médio e longo”, afirma Silvano Aragão, diretor executivo de Desenvolvimento Humano e Organizacional do Grupo Patrimar.
“Reduz o retrabalho, melhora a qualidade dos serviços e permite maior controle sobre a capacitação da equipe”, completa.
A alternativa encontra, no entanto, resistência quando a construtora não possui um volume de obras suficiente para ocupar operários com diferentes aptidões e especialidades durante o ano todo.
“Não vejo a mão de obra própria como solução, mas apenas como um paliativo para uma ou outra atividade em um determinado momento ou por uma situação particular da empresa”, afirma Renato Genioli Junior, sócio-fundador da construtora e incorporadora R. Yazbek.
“Se eu tenho a mão de obra dentro da construtora e não tenho frente de trabalho para um determinado profissional, ele vai ficar parado ou terei que dispensá-lo. Não vale a pena”, conclui o construtor.
2) MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO
O ambiente em um canteiro de obra com sistema construtivo convencional costuma envolver – em maior ou menor escala, a depender do grau de racionalização na obra – sujeira, poeira, barulho e muito esforço físico.
Um dos participantes do debate promovido pelo Portal AECweb, Raul Resende, head na Alvarez & Marsal Infra no segmento de Real Estate, relata uma passagem interessante durante uma pesquisa qualitativa que realizaram sobre o tema.
“Um dos entrevistados contou que ficava envergonhado ao pegar o ônibus do trabalho, de volta para casa, sem poder tomar banho. Em várias obras, não havia vestiário e nem local adequado para guardar uma toalha e um sabonete”, afirma Resende.
“Algo relativamente simples, como proporcionar banheiros e vestiários torna o ambiente de trabalho muito mais digno e confortável para as pessoas”, completa o executivo.
Trata-se de um exemplo clássico de algo que pode ser aprimorado no curto prazo e oferecer resultados imediatos.
“É importante criar um ambiente de trabalho respeitoso e motivador”, revela Aragão, da Patrimar.
“Assim como ser muito engajado na segurança do trabalho. A valorização das pessoas constitui a base do sucesso para enfrentar esse desafio da falta de mão de obra”, conclui.
3) AUMENTO DA REMUNERAÇÃO
Um dos argumentos utilizados por algumas lideranças setoriais para tentar atrair novos operários para os canteiros é o fato de a remuneração na construção civil estar mais atrativa.
Motivado, em parte, pela própria escassez da mão de obra, o fenômeno se concentra em funções específicas ou que exigem maior especialização ou qualificação.
“Precisamos mostrar para o pessoal que tem optado por trabalhar com aplicativos de entrega que atuar na construção civil permite alcançar uma remuneração muito melhor”, afirma Genioli.
“Quando recebem muito bem, os entregadores ganham de 2,5 mil a 3 mil reais. Temos bons pedreiros, armadores e carpinteiros que chegam a atingir remuneração mensal entre 10 e 14 mil. O profissional sem experiência vai começar com menos do que isso, mas, em alguns anos, vai progredir e pode chegar nesse patamar superior”, completa o construtor.
4) DESENVOLVIMENTO DE PLANO DE CARREIRA
A expressão pode até soar meio distante para uma atividade de cunho temporário, sem local fixo de produção e marcada pela alta informalidade.
Mas pensar em um plano de carreira para os profissionais dos canteiros de obras tem sido uma das alternativas das construtoras para reter e atrair novos talentos.
“É importante oferecer uma perspectiva de crescimento de médio e longo prazo para os profissionais do setor”, alerta Aragão.
“As novas gerações são mais ansiosas nesse sentido e se sentem mais seguras quando o plano de carreira está claro e combinado entre as partes”, conclui o executivo da Patrimar.
5) QUALIFICAÇÃO E TREINAMENTO
A falta de treinamento e educação continuada nos canteiros de obras no Brasil se alicerça em uma crença discutível: a ideia de que o empresário vai alocar recursos na qualificação, mas a alta rotatividade da mão de obra no setor o impedirá de ‘usufruir’ do investimento.
Ou seja, o trabalhador migrará para outra oportunidade de trabalho assim que tiver chance e levará com ele o conhecimento adquirido.
De fato, é um risco que se corre em todos os setores, não apenas na construção.
Por outro lado, promover tais ações ajuda a reter talentos e criar laços mais estáveis com as empresas.
E não fazer nada acaba por contribuir para a maior rotatividade.
Melhor ainda se o treinamento estiver vinculado ao plano de carreira na empresa.
“O profissional deve passar por treinamentos e avaliações periódicas, que permitam galgar novas posições e melhores remunerações”, revela Aragão, da Patrimar.
6) ATRAÇÃO DA MÃO DE OBRA FEMININA
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no ano de 2022, 48,5% dos brasileiros eram homens e 51,5% mulheres.
Isso significa que há 6 milhões de mulheres a mais do que homens no País.
Só por aí já é possível ter uma ideia do gigantesco potencial da utilização da mão de obra feminina no setor.
Algumas empresas já perceberam a oportunidade.
“Descobrimos que muitas mulheres fazem curso de pedreiro e não conseguem entrar no mercado de trabalho porque as empresas exigem profissionais com experiência”, afirma Aragão, da Patrimar.
O problema é claro: como as mulheres nunca tiveram oportunidade no mercado da construção civil, principalmente em funções de campo, poucas possuem experiência.
“Por isso, estamos fazendo um levantamento e trazendo profissionais para uma jornada experimental na construtora. A ideia é que se tornem pedreiras, com possibilidade de crescimento e eventuais promoções para encarregadas e mestres de obra”, explica o diretor da Patrimar.
Outro ponto fundamental se refere à melhoria das condições de trabalho, mencionada no item 2, com instalações apropriadas e adequadas para as necessidades das mulheres.
“Trabalhei em obra no começo da minha carreira e nos acostumamos a passar o dia inteiro sem ir ao banheiro, porque não havia sanitário feminino no canteiro” afirma Iria Lícia Oliva Doniak, presidente executiva da ABCIC (Associação Brasileira da Construção Industrializada de Concreto).
“Hoje isso já é diferente, mas muitas dessas questões levam um bom tempo amadurecer quando, na verdade, requerem medidas simples, de fácil implementação”, completa.
7) INDUSTRIALIZAÇÃO DOS CANTEIROS DE OBRAS
É praticamente consenso no mercado de que o investimento em sistemas construtivos industrializados e na mecanização dos canteiros constitui uma das principais soluções para o problema da falta de operários qualificados.
Reduz a necessidade de mão de obra e aumenta a produtividade, ao mesmo tempo em que auxilia na atração de novos nichos de trabalhadores, como os jovens e as mulheres.
“Quanto mais tecnológico e com menor exigência de força física for o processo de construção, mais atrativo será o setor para vários nichos importantes, que podem ser mobilizados, como as mulheres”, afirma Iria, da ABCIC.
Não se trata, porém, de um caminho simples e fácil de ser percorrido.
Há uma cultura consolidada da construção convencional entre muitos profissionais do setor e uma dificuldade de implementar soluções industrializadas em obras de menor escala e sem tanta repetitividade como, por exemplo, empreendimentos residenciais de médio e alto padrão.
Genioli, da R. Yazbek, considera a industrialização como uma meta relevante, mas enxerga algumas dificuldades, tais como a falta de fornecedores especializados – os chamados sistemistas – e a resistência dos clientes finais, que vinculam qualidade às construções convencionais.
“Temos avanços pontuais em subsistemas específicos, como instalações hidráulicas e elétricas, mas a indústria ainda não tem capacidade para atender a demanda, em larga escala, em todas as etapas da obra”, conclui o construtor.
Redação CNPL sobre artigo de Eric Cozza
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