Generic selectors
Somente termos específicos
Buscar em títulos
Buscar em conteúdo
Post Type Selectors

O Tema 1.046 STF e a prevalência das negociações sindicais

Outras notícias

...

Justiça reconhece covid-19 como doença ocupacional e determina pagamento de danos morais

A 17ª Turma do TRT da 2ª Região manteve sentença que reconheceu covid-19 como doença do trabalho no caso de chefe…

Guia do CFC orienta faculdades na adoção do novo currículo de Ciências Contábeis

Documento comenta as novas Diretrizes Curriculares Nacionais do curso, que objetivam formar profissionais mais bem preparados para o mercado de…

Modernização do Código Civil brasileiro: Impactos e perspectivas

A lei 14.905/24, sancionada em 28/6/24, moderniza o Código Civil, focando na correção monetária e juros em inadimplemento.  A lei…

Japão quer implementar semana de 4 dias no trabalho, mas enfrenta desafios culturais

Apesar de incentivos governamentais, resistência social e cultural dificulta implementação de jornada mais curta O governo japonês intensificou recentemente os…

Desde a sua criação, a legislação trabalhista no Brasil foi marcada por um robusto protecionismo em relação ao trabalhador, característica originada com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), instituída em 1943.

Contudo, com a evolução das relações de trabalho e a necessidade de modernização das normas laborais, surgiu a reforma trabalhista, que propôs uma flexibilização e maior adaptabilidade às necessidades contemporâneas tanto das empresas quanto dos trabalhadores.

Do ponto de vista normativo brasileiro, a Constituição assegura, em seu artigo 7º, inciso XXVI, a autonomia privada coletiva, conferindo validade às normas provenientes de convenções e acordos coletivos.

No âmbito internacional, as Convenções nº 98 e nº 154 da Organização Internacional do Trabalho garantem o direito e incentivam a negociação coletiva.

A Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, também conhecida como reforma trabalhista, tem como um de seus objetivos principais o fortalecimento da autonomia e da legitimidade das negociações coletivas.

A justificativa para tal afirmação se reflete na vontade do legislador ao incluir o artigo 611-A na CLT, o qual estabelece um rol exemplificativo de situações em que a legislação pode ser flexibilizada por meio de convenções coletivas ou acordos coletivos celebrados entre sindicatos e empregadores.

Direitos trabalhistas irrenunciáveis

Em contrapartida, o artigo 611-B define um rol taxativo de direitos que são irrenunciáveis e, portanto, não passíveis de negociação, delimitando com clareza os direitos protegidos pela lei.

O doutrinador e ministro do Superior Tribunal do Trabalho, Mauricio Godinho Delgado, dispõe acerca do assunto que:

Note-se que o art. 611-A, caput, da CLT, conforme redação promovida pela Lei n. 13.467/2017, autoriza a ampla prevalência das regras coletivas negociadas em contraposição às normas jusindividuais imperativas estatais existentes. À exceção apenas do rol de direitos previsto no art. 611-B da CLT (também por redação imposta pela nova lei), o que se estabelece é uma drástica ruptura com o padrão de direitos e de proteção ao trabalho firmados pela ordem jurídica heterônoma estatal do País, em seu tripé estruturante, ou seja, Constituição da República, normas internacionais vigorantes no Brasil e legislação federal trabalhista.

Há, por consequência, na nova lei clara rejeição ao princípio da adequação setorial negociada, que estabelece a prevalência das normas autônomas juscoletivas sobre o padrão geral heterônomo justrabalhista fixado, desde que respeitados os seguintes critérios: “a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta)

Nesse cenário, em 2 de junho de 2022, o STF (Supremo Tribunal Federal), ao julgar o ARE 1.121.633, decidiu que as normas estabelecidas em acordos e convenções coletivas podem limitar ou restringir direitos trabalhistas, salvo nas hipóteses em que tais direitos estejam assegurados pela Constituição. Fixando a tese de repercussão geral no Tema 1046:

“São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.”

Autonomia dos trabalhadores

A decisão do STF sobre este tema possui implicações significativas. De um lado, ela valida a importância da autonomia coletiva e a capacidade dos sindicatos de negociar de forma efetiva em nome dos trabalhadores.

De outro, estabelece limites claros para assegurar que os direitos fundamentais dos trabalhadores não sejam comprometidos.

Veja-se que, ao reconhecer a repercussão geral do ARE 1.121.633, o STF reafirmou a constitucionalidade dos acordos e convenções coletivas que versam sobre direitos trabalhistas.

Essa decisão consolida de vez a autonomia e a legitimidade das negociações coletivas, promovendo um ambiente de mais segurança jurídica para as empresas.

Consubstanciado a isso, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) tem corroborado as negociações sindicais através da reforma de decisões de tribunais regionais que afastam ou anulam cláusulas de negociação coletiva após a fixação do Tema 1.046.

Isso se deve ao fato da forte influência dos princípios da proteção, da norma mais favorável e da vedação à alteração contratual lesiva.

Assim, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis, o negociado prevalece sobre o legislado, corroborando que uma das finalidades centrais da reforma trabalhista foi validada pela Suprema Corte.

Sindicatos perdem força

Frisa-se que, embora a Lei nº 13.467/2017 tenha conferido maior poder às negociações coletivas, também houve um enfraquecimento dos sindicatos e um efetivo desmonte da organização sindical. Isso ocorreu, em grande parte, devido à institucionalização do caráter facultativo da contribuição sindical, o que tornou a negociação coletiva, em certa medida, desbalanceada.

Em conclusão, o Tema 1.046 do STF constitui um marco relevante no ordenamento jurídico, ao reafirmar a constitucionalidade da prevalência do negociado sobre o legislado em inúmeros aspectos das relações trabalhistas.

Tal decisão reforça a autonomia privada coletiva e a importância da negociação coletiva como instrumento de adequação das condições laborais às especificidades de cada categoria profissional, dentro dos limites estabelecidos pela Constituição.

Entretanto, a flexibilização decorrente dessas negociações não pode transgredir direitos fundamentais indisponíveis, como aqueles relativos à saúde, segurança e dignidade do trabalhador.

Por fim, o entendimento consubstanciado no Tema 1.046 revela-se um ponto de equilíbrio entre a necessária modernização das relações de trabalho e a inafastável proteção dos direitos mínimos assegurados pela legislação trabalhista, resguardando o ordenamento jurídico.

Referências

CALCINI, MORAES. RICARDO, LEANDRO BOCCHI. A prevalência do negociado sobre o legislado sob a ótica do STF. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-jun-09/pratica-trabalhista-prevalencia-negociado legislado/#:~:text=A%20conven%C3%A7%C3%A3o%20coletiva%20e%20o%20acordo%20coletivo%20de%20trabalho%20t%C3%AAm,de%20trinta%20minutos%20para%20jornadas. Acesso em: 27 ago. 2024

DELGADO, MAURICIO GODINHO. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017 / Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. – São Paulo : LTr, 2017.

ROCHA. ARMANDO GOMES. O impacto das decisões do TST nas negociações sindicais. Disponível em: https://www.jota.info/artigos/o-impacto-das-decisoes-do-tst-nas-negociacoes-sindicais. Acesso em: 27 ago. 2024.

Redação CNPL sobre artigo de Desirée Evangelista